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Entrevista

Em entrevista, a psicóloga Mônica Silva desvenda a libido, termo conceituado por Freud

Em entrevista ao Correio do Estado, a psicóloga Mônica Silva desvenda o termo conceituado por Freud, que é central na psicanálise, mas que já aparecia nos escritos de Santo Agostinho no século 4

28/10/2024 11h42
Por: Diário da Feira
Fonte: Correio do Estado
Em entrevista, a psicóloga Mônica Silva desvenda a libido, termo conceituado por Freud - Foto: REPRODUÇÃO
Em entrevista, a psicóloga Mônica Silva desvenda a libido, termo conceituado por Freud - Foto: REPRODUÇÃO

O que é a libido?

Mônica Silva – de forma geral, libido é o termo psicanalítico utilizado para descrever a busca e a satisfação dos desejos, que abarcam diversas áreas da vida humana, incluindo a sexualidade. Para Freud, a libido é uma energia afetiva que se desenvolve durante toda a vida do indivíduo.

Sendo a libido a força motriz de todo o comportamento e fazendo parte da identidade, pode ser direcionada a diversos campos, como a criatividade, os esportes e também ao sexo. Em “Terapia Cognitivo Comportamental e Terapia Cognitiva Sexual”, esse termo será usado como sinônimo para desejo e desejo sexual.

 

Tem sempre a ver necessariamente com o que se chama de tabu?

Não, a libido ou desejo está relacionada a estados biopsicossocioemocionais saudáveis. Quando o indivíduo se encontra relaxado, despreocupado e tem sua sobrevivência garantida, ele tem espaço para dar vazão aos seus desejos, sejam eles de ordem sexual ou não.

Os tabus geralmente são relacionados à vergonha por se achar que se trata apenas da sexualidade. E nos revela o quanto precisamos de espaços como esse aqui para divulgar e questionar nossos conhecimentos a respeito desse e outros temas.

 

Qual a melhor coisa que a libido pode proporcionar? E a pior coisa?

Uma libido saudável pode ser uma forte aliada ao autoconhecimento e à autoestima. Um indivíduo disposto a se conhecer e explorar seus potenciais – acadêmicos, artísticos, relacionais, espirituais, etc. – tem suas crenças positivas sobre si, os outros e o mundo fortalecidas e desenvolve boas competências sociossexuais. 

Infelizmente, quando a pessoa passa por situações como bullying, maus tratos, invalidações, pode ter uma visão negativa de si ampliada, e isso dificultar a busca por novos contextos e experiências que lhe fariam ser mais habilidosa. Nesses casos, o recomendado é a busca por terapia.

 

Como ela pode se manifestar no organismo e no comportamento humano?

No senso comum, há uma identificação imediata e bastante restrita ao desejo sexual e à sua manifestação.
A libido se manifesta, como falamos, enquanto desejo ou energia afetiva que nos impulsiona em direção à satisfação. Ela se manifesta como motivação. 

 

Pode-se descrever seu funcionamento de forma mais ou menos esquemática?

Podemos observá-la surgir inicialmente como pensamentos repetitivos em relação a um tema, atividade ou pessoa, o que chamamos de interesse, passando por emoções e sensações como alegria, euforia, contentamento, encantamento e, depois, transformar-se em inquietação, vontade de agir, se aproximar, tentar, arriscar. 

 

E qual seria o papel da libido? Tanto para o indivíduo quanto para seu parceiro ou mesmo para a sociedade.

Uma pessoa com uma boa libido geralmente revela ter equilíbrio entre saúde mental, física e afetiva. É menos estressada, mais ativa, produtiva, se diverte e se vincula com mais facilidade. Em resumo, alguém que consegue identificar e satisfazer as próprias necessidades é mais feliz.

 

Por que a libido costuma ser mais associada a algo disfuncional do que a um comportamento saudável?

Creio que isso esteja ligado ao fato de se pensar automaticamente em sexualidade e as dificuldades de se falar abertamente sobre o tema.

Ainda hoje não encontramos muitos ambientes que promovam debates que normalizem nossos desejos, o fantasiar e o explorar. Isso faz com que socialmente se tenha a impressão de que o assunto deva ser tratado apenas em consultórios ou conversas privadas.

 

Há remédios e tratamentos, formas de evitá-la, controlá-la ou potencializá-la?

Antes de recorrer a qualquer intervenção, precisamos avaliar e contextualizar cada queixa. Em alguns casos, a disfunção no desejo pode ter origem orgânica, psicológica ou ambas. Por isso, realizamos uma boa anamnese e lançamos mão da ajuda de outros profissionais para verificar se as alterações estão sendo causadas por falta ou excesso de algum hormônio, nutriente ou outras condições, como dores, distúrbios do sono, elevação dos níveis de estresse e transtornos.

Depois de ter esses dados em mãos, formulamos as intervenções necessárias para cada queixa. Algumas vão precisar, sim, do auxílio farmacológico. Já outras serão resolvidas com treinos de habilidade, alterações de estilo de vida, contexto ou outros procedimentos, como fisioterapia e cirurgia.

 

A partir de que idade ou faixa etária seria recomendável que as pessoas passassem a tomar consciência da própria libido?

Usando a palavra libido como sinônimo de desejo, verificamos que logo no início da vida as crianças têm interesses nas mais diversas áreas e se lançam a explorar o que lhes chama a atenção.

Sendo assim, o mais indicado a fazer para que esses indivíduos sigam se relacionando de forma saudável com a própria libido é começar a educá-los desde cedo em relação ao próprio corpo, consentimento, regras sociais.

 

A libido varia conforme gênero, idade, lugares, regiões, culturas e outras circunstâncias?

De forma geral, o surgimento dos nossos desejos pode ocorrer tanto de forma espontânea – vemos algo, temos interesse, nos aproximamos e tentamos explorar as possibilidades – quanto de forma refratária, ou seja, inicialmente não nos chama muito a atenção, mas a exposição repetida ao estímulo, como convites e propagandas, pode gerar um interesse em participar e, no decorrer da exploração, descobrimos como aquela atividade pode ser prazerosa.

A forma da manifestação e frequência de como esse desejo será expresso é que vai variar conforme o interesse, a faixa etária, as culturas e as situações.

 

Há diferenças marcantes na manifestação da libido em outros animais ou, quem sabe, mesmo no reino vegetal?

 

A maior diferença observável entre humanos e outros animais é que nossos condicionamentos sociais, verbais e não verbais geram os tabus e a vergonha envolvidos no processo de descoberta e exploração da nossa libido, podendo gerar uma série de dificuldades pessoais e sociais que não vemos em outros grupos.

Apesar de ser possível realizar a seleção sexual, verificar trocas de sexo durante o desenvolvimento e autofecundação no reino vegetal, não temos dados que comprovem seu comportamento em relação à libido.

Saiba

Libido é uma palavra que deriva do latim e significa desejo ou anseio. Trata-se do instinto pelo qual se manifesta a sexualidade, o desejo sexual. Para Sigmund Freud (1856-1939), considerado o pai da psicanálise, a libido ocorre de diferentes maneiras do nascimento à puberdade.

É uma manifestação da vida psíquica, que ocorre em fases distintas e varia para mais ou para menos conforme o estado emocional do indivíduo e sua taxa de hormônios – testosterona e estrogênio. Uma libido desregulada demanda intervenção médica, análise hormonal e o suporte de um psicólogo.

Freud inicialmente conceitua a libido como a energia sexual no sentido estrito, como o fenômeno do “impulso” do desejo e do prazer. Em seguida, confrontando-a com o instinto de morte, o médico austríaco define libido como a energia dos instintos vitais, “que tem a ver com tudo o que pode ser resumido como o amor”.

A libido, portanto, segundo Freud, não está relacionada somente com a sexualidade, mas também está presente em outras áreas da vida, como nas atividades culturais, caracterizadas pela sublimação da energia libidinosa.

Ele chega a fazer a equivalência com o conceito grego de Eros, que não é exclusivamente o desejo sexual, mas abrange toda a força vital e a vontade de viver.

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